Dinah Silveira de Queiroz, Portinari Desenhista

1977

'Da última vez que vi Portinari, seus olhos estavam rasos d'água. Se não me engano, foi no Castelo; eu ia em busca de uma condução e ele vinha com sua Maria. Foi muito pouco o que dissemos. Estava magro; abraçou-me profundamente e disse: Imagine, não posso pintar mais, estou proibido pelo médico. Era a hora da tarde em que as coisas são iluminadas de través e os olhos azuis de Portinari com as lágrimas que não queriam descer me apareceram como se contassem também sobre sua obra imortal. Maria não deixou muito tempo para conversa; ele não deveria comover-se. Tive vontade de sair atrás dele e dizer: Você já nos deu tanto. Você já nos deu a obra mais grandiosa que um pintor pode oferecer à sua terra, já nos acumulou de uma riqueza que vai varar os tempos, por isso, pode descansar sem preocupação por não estar mais pintando. Eles já estavam longe e as palavras morreram no meu pensamento. 
Só depois da morte de Portinari que eu estive na ONU e vi, no deslumbramento do apogeu de sua arte, o painel Guerra e Paz. Cada figura me apareceu facetada: astro ou pedra preciosa, com luz própria e eu tive vontade de dizer àquela gente toda que passeava pelo saguão, homens e mulheres vindos de todas as partes do mundo: Vejam vocês aí está nossa glória, aí está o painel de nosso maior pintor. Eu também nasci no Brasil como ele, Portinari…'

Dinah Silveira de Queiroz

Escritora

In: Museu Nacional de Belas Artes (Rio de Janeiro, RJ); Museu de Arte de São Paulo (São Paulo, SP). Portinari Desenhista. Apres. Ralph Camargo; texto Afonso Arinos et al. Rio de Janeiro, RJ, 1977. 264 p. il. [catálogo]

 
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